shutterstock_2297152897

Do Big Data à IA autônoma: como criar uma cultura de dados nas empresas

Nos últimos anos, o volume de dados gerados pelas empresas cresceu de forma exponencial. Mas, ao contrário do que se esperava, a maioria delas ainda não sabe o que fazer com tanta informação. É como se tivessem recebido uma biblioteca inteira sem aprender a ler.

Dados não são valor por si só. Sem contexto, sem estrutura, sem perguntas inteligentes por trás, eles são apenas ruído. E mais: sem uma cultura de dados — aquela que orienta decisões, desafia intuições e sustenta estratégias — nem o melhor algoritmo pode salvar uma organização da mediocridade.

De acordo com uma pesquisa recente da NewVantage Partners, embora 91% das empresas entrevistadas estejam investindo em iniciativas de dados e IA, apenas 26,5% afirmam ter realmente conseguido criar uma cultura orientada por dados. O número assusta, mas explica muita coisa: temos tecnologia de sobra e mentalidade de menos. E cultura, nesse caso, não se compra — se constrói.

Muita gente ainda acredita que criar uma cultura de dados é adquirir plataformas, dashboards e ferramentas de business intelligence. Mas cultura não nasce de um software. Ela nasce de comportamento.

É quando o CEO pergunta “o que os dados dizem sobre isso?” antes de tomar uma decisão estratégica. Quando o RH antecipa pedidos de demissão com base em padrões de comportamento. Quando o marketing fala em comportamento preditivo, e não apenas em campanhas de alcance. Quando o chão da fábrica entende que um dado inserido errado pode comprometer toda uma cadeia de decisões.

Cultura de dados não vem de ferramentas, mas de atitudes: nasce quando decisões em todos os níveis são guiadas pelo que os dados realmente dizem (Imagem: FAMILY STOCK/Shutterstock)

Essa mentalidade é o alicerce necessário para que a inteligência artificial possa, de fato, agir com autonomia. Porque IA autônoma — aquela que aprende, ajusta, decide e executa — precisa de dados limpos, estruturados, confiáveis e disponíveis.

E isso não se improvisa. Não adianta sonhar com uma IA estratégica se os dados ainda estão trancados em silos, espalhados em planilhas desconectadas, com má governança e baixa confiabilidade. A IA só consegue aprender com o que oferecemos — e se oferecermos um ambiente caótico, os resultados refletirão exatamente isso.

O ponto mais crítico é que muitas empresas ainda usam os dados como justificativa para decisões já tomadas. Ao invés de guiar a estratégia, os números viram apenas uma chancela do que a alta liderança já decidiu por instinto.

Esse viés de confirmação destrói qualquer chance de desenvolvimento analítico real. Uma cultura de dados de verdade exige humildade: saber ouvir o que os dados dizem mesmo quando contradizem nossas crenças mais arraigadas.

Cultura corporativa.
Em vez de guiarem decisões, os dados ainda servem como aval para escolhas intuitivas (Imagem: Gorodenkoff/Shutterstock)

E isso tem tudo a ver com o futuro. Estamos à beira de uma nova era, em que a IA não será apenas uma assistente, mas uma tomadora de decisão. Para isso, precisamos preparar o terreno agora.

Uma boa pergunta para começar: quem toma decisões na sua empresa — os dados ou os cargos? Se ainda é o cargo que pesa mais, a autonomia da IA vai continuar sendo uma promessa distante.

Leia mais:

Criar uma cultura de dados é uma jornada que começa no topo, mas que só se consolida quando chega na base.

E, paradoxalmente, quanto mais autônoma for a inteligência artificial, mais humana precisa ser a cultura que a sustenta. Porque, no fim das contas, dados não servem para desumanizar processos — mas para revelar padrões, entender comportamentos e melhorar a experiência de quem está na ponta.

Cultura de dados, IA
A cultura de dados começa na liderança, se consolida na base e, quanto mais sustenta a IA, mais precisa ser humana (Imagem: metamorworks/Shutterstock)

O dado mais importante ainda é o humano. E a empresa que entender isso, antes das outras, vai deixar de colecionar dados e começar a construir vantagem competitiva real. Não se trata apenas de transformação digital. Trata-se de transformação cultural.

O post Do Big Data à IA autônoma: como criar uma cultura de dados nas empresas apareceu primeiro em Olhar Digital.

shutterstock_2497349479-1

Seis lições que a IA generativa tem nos deixado

Vivemos uma era em que a inteligência artificial generativa não é apenas um avanço tecnológico — é um revelador brutal. Mais do que ferramenta, ela é espelho. Um espelho de alta precisão que reflete com crueza não só o que somos, mas aquilo que, por conveniência ou covardia, escolhemos fingir ser.

Projetamos nela nossa obsessão por produtividade, nossa fixação por escala, nosso desdém pelo tempo e, principalmente, nossa crescente impaciência com tudo aquilo que é humano demais: o erro, a hesitação, a travessia lenta.

Desde o surgimento do ChatGPT, da Midjourney e de suas inúmeras derivações, temos nos encantado com a capacidade das máquinas de simular o humano. Mas talvez o que nos incomode de verdade não seja o espanto com o que elas fazem — e sim o que isso revela sobre nós. A IA não nos ultrapassa: ela nos desmascara.

A generatividade da máquina escancara a estagnação do humano.

Nunca foi tão fácil produzir — e, paradoxalmente, tão difícil emocionar. A IA generativa trouxe à tona uma constatação incômoda, muitas vezes velada sob o volume de entregas: grande parte do que já se criava antes era, na verdade, superficial, redundante, automatizado sem automação.

A diferença agora é que a mediocridade ganhou concorrência — e ela é rápida, gratuita, escalável e, ironicamente, mais eficiente do que muitos humanos que a alimentam.

A IA generativa torna a produção rápida, mas a mediocridade agora é mais eficiente e escalável (Imagem: Boy Anthony/Shutterstock)

De acordo com a Gartner, até 2026, 90% de todo o conteúdo digital será gerado por máquinas. Isso significa que, no novo paradigma, não competiremos mais por agilidade ou quantidade — mas por sentido, por significância.

O talento, antes diferencial, torna-se pré-requisito básico. O que nos distingue, no fim, não é mais a capacidade de entregar, mas a de interpretar, emocionar, transcender. Sentir, em profundidade, tornou-se um ato de resistência.

A IA tornou o conteúdo abundante. Mas não necessariamente relevante. Nunca se escreveu tanto — e nunca se disse tão pouco. Em meio a esse dilúvio de informações, a confiança tornou-se um recurso escasso, quase clandestino. Ela já não se conquista pelo conteúdo em si, mas pela reputação de quem o oferece e, sobretudo, pelas razões pelas quais o faz.

A inflação de conteúdo expôs a escassez de autenticidade.

O novo protagonismo não será dos que produzem mais, mas dos que dizem com propósito. Curadores, líderes de pensamento, vozes éticas e conscientes emergem como faróis em meio ao nevoeiro do conteúdo genérico.

A curadoria crítica — que separa o essencial do ruidoso, o verdadeiro do verossímil — assume papel de urgência civilizatória.

A IA não é neutra — e tampouco é ingênua.

Um dos maiores equívocos contemporâneos é tratar a inteligência artificial como algo imparcial, puro, inodoro. Isso é, no mínimo, perigoso. A IA aprende com o que já foi dito — e perpetua, com verniz de eficiência, os mesmos preconceitos que tentamos, há séculos, desconstruir. Racismo algorítmico, desigualdade de gênero, eurocentrismo epistêmico: tudo isso ganha fluidez, escala e polidez na voz da máquina.

AI ethics
Tratar a IA como imparcial é perigoso, pois ela perpetua preconceitos históricos com a fluidez e eficiência da máquina (Imagem: Ole.CNX/Shutterstock)

Não faltam exemplos. O DALL·E, ao gerar imagens de liderança exclusivamente masculina e branca. Os sistemas de moderação enviesados. As bases de dados treinadas sobre conteúdos que refletem o mundo como ele é — e não como deveria ser. A tecnologia, sem a crítica humana, apenas reafirma a ordem vigente. E isso é tudo, menos inovação.

Escalamos a tecnologia — mas negligenciamos a governança.

Enquanto as aplicações de IA evoluem em ritmo exponencial, as regulamentações rastejam em compasso analógico. Essa assimetria é grave. Temos tratado a inovação como valor absoluto, sem ponderar sua ambiguidade essencial: toda tecnologia pode libertar ou aprisionar, democratizar ou explorar, dependendo de quem a controla — e com quais interesses.

Regulamentações acompanham devagar o avanço da IA, ignorando os riscos de controle e interesses envolvidos (Imagem: ImageFlow/Shutterstock)

O AI Act, aprovado pela União Europeia em 2024, é um alento. Mas ainda rascunha as complexidades envolvidas em temas como autoria intelectual, manipulação de massas, privacidade de dados e desinformação.

E no Brasil? A pauta ainda é periférica, quando deveria ser central. Enquanto isso, empresas seguem monetizando, sem freios, um campo que deveria ser tratado com responsabilidade e ética coletiva.

A ameaça real não é a IA — é a ausência de um projeto humano

A frase “a IA não vai roubar seu emprego, mas alguém que usa IA vai” tem servido como mantra nos corredores corporativos. Mas é raso demais para o abismo que se abre. A pergunta mais urgente não é quem será substituído — mas por que seguimos formando pessoas para serem substituíveis.

IA versus humanos
A frase “a IA não vai roubar seu emprego, mas alguém que usa IA vai” tem servido como mantra nos corredores corporativos. (Imagem: Leonardo Santtos/Shutterstock)

A IA escancara a obsolescência de funções humanas que sempre foram mais operacionais do que intelectivas, mais repetitivas do que reflexivas. É preciso redesenhar, com urgência, não apenas o que chamamos de trabalho — mas o que chamamos de valor, de criação, de inteligência. A IA é só o gatilho.
O que está em jogo é nossa própria relevância enquanto espécie criadora

A maior lição da IA generativa não é sobre a máquina — é sobre a humanidade que deixamos adormecer

Ela nos obriga a encarar nossa preguiça intelectual, nossa terceirização da autoria, nosso fascínio por atalhos. Nos lembra que ter acesso ao conhecimento não é o mesmo que compreendê-lo. Que escrever bem não é o mesmo que pensar bem. Que produzir rápido não é o mesmo que viver com profundidade.

IA e criatividade.
Cada vez somos mais confrontados pela IA com nossa preguiça intelectual e a ilusão de que rapidez e acesso ao conhecimento substituem reflexão e profundidade (Imagem: Bishop Iuliia/Shutterstock)

A inteligência artificial é uma ferramenta de poder imenso — mas perigosa quando utilizada por uma sociedade que ainda não aprendeu a lidar com sua própria ignorância, sua superficialidade e sua pressa.

No fim das contas, o maior legado da IA generativa pode ser paradoxal: nos forçar a lembrar o que significa ser humano. Não no sentido biológico, mas existencial. Preservar, diante da máquina que tudo simula, aquilo que nunca deveria ser simulado: o espanto, a dúvida, a experiência, a consciência. E, talvez, a beleza de não saber.

O post Seis lições que a IA generativa tem nos deixado apareceu primeiro em Olhar Digital.

shutterstock_1845419503

A arte de enxergar o que o cliente quer antes que ele diga

A maior revolução no atendimento ao cliente hoje não é a rapidez da resposta, mas a precisão da escuta — antes mesmo que a pergunta exista.

Por décadas, o atendimento foi construído sobre a lógica da reação. O consumidor relata um problema, o sistema registra, o atendente responde. Um processo funcional, sim, mas cronicamente atrasado. Porque, enquanto a empresa age, o cliente já acumulou frustração, ruído, desconfiança. Nesse vácuo entre a necessidade e a resposta nasce a ruptura da experiência.

Agora, imagine inverter essa equação: em vez de reagir, prever. Em vez de remediar, antecipar. A análise preditiva torna isso possível. Não como mágica, mas como método. Ao ler padrões de comportamento, cruzar históricos de interação e modelar propensões de consumo, a tecnologia entrega às empresas algo muito mais valioso do que dados: contexto.

Atendimento deixa de ser reação e passa a ser antecipação, com a análise preditiva transformando dados (Imagem: Andrey_Popov/Shutterstock)

É aí que mora a virada. Porque atender bem deixou de significar simplesmente resolver o problema. Hoje, significa não deixar o problema nascer.

Dados da Salesforce apontam que 73% dos consumidores esperam que as empresas entendam suas necessidades e expectativas; 62% acreditam que as empresas deveriam antecipar suas necessidades. Os consumidores entendem que as marcas usam seus dados pessoais para entregar mensagens personalizadas e 90% deles gostariam de receber anúncios baseados em seus interesses e histórico de compras/navegação.

É um espelho cultural: o cliente contemporâneo não quer apenas ser ouvido — ele quer ser adivinhado e empresas que ignoram essa expectativa estão, silenciosamente, cavando seu próprio irrelevante.

Análise de dados.
Consumidores querem que marcas antecipem suas necessidades e personalizem interações (Imagem: amgun/Shutterstock)

Mas a análise preditiva vai além do “saber antes”. Ela permite desenhar jornadas mais fluídas, ofertas mais sensíveis, experiências mais coerentes com quem aquele cliente é — e não apenas com o que ele consome.

Um cliente que costuma acessar o aplicativo de madrugada e evita ligações longas, por exemplo, deve ser abordado de forma diferente de outro que prefere atendimento humano em horário comercial. Isso é empatia algorítmica. E está longe de ser trivial.

Leia mais:

Claro, existe o risco de transformar tudo em predição vazia — e aí a tecnologia se torna intrusiva, quase arrogante. Não se trata de vigiar, mas de interpretar. Não de controlar o cliente, mas de cuidar dele. A ética do dado importa tanto quanto a sua capacidade analítica. A boa análise preditiva não anula o humano — ela o refina.

Análise de dados.
Análise preditiva refina a experiência do cliente com empatia algorítmica, sem vigiar ou invadir (Imagem: NicoElNino/Shutterstock)

Mais do que nunca, personalizar não é um luxo, é uma expectativa silenciosa que define quem fica e quem desaparece no ruído do mercado. A previsibilidade, nesse caso, não mata a experiência — ela a eleva. Afinal, surpreender também pode ser atender sem que a dor seja expressa.

O desafio, claro, é técnico, estratégico e cultural. Exige investimento, sim, mas sobretudo exige uma mudança de mentalidade: parar de tratar atendimento como custo e começar a tratá-lo como alicerce da reputação. Porque o cliente esquece rápido do atendimento que deu certo — mas nunca esquece do que chegou tarde demais.

Análise preditiva.
Personalizar virou obrigação: quem antecipa necessidades constrói reputação (Imagem: Atomic62 Studio/Shutterstock)

Quem conseguir antecipar o incômodo, oferecer o caminho antes da dúvida e resolver o que ainda nem se manifestou, cria mais que satisfação. Cria confiança. E confiança, sabemos, não se compra — se conquista. Um insight por vez.

O post A arte de enxergar o que o cliente quer antes que ele diga apareceu primeiro em Olhar Digital.

shutterstock_1816844858

O algoritmo nos deixou burros(as). E você ainda curtiu este post

Você lê notícias pelo celular, reproduz o que aquele(a) influenciador(a) diz e acredita que está bem-informado(a), que as suas opiniões são fruto de reflexão própria e crítica. Mas e se grande parte do que você pensa – ou pensa que pensa, tiver sido moldada por sistemas automatizados que conhecem as suas preferências, aversões e o que te faz clicar?

Seja bem-vindo(a) à bolha de informação. Um ambiente confortável, colorido, sedutor e perigosamente eficaz.

Fato que as redes sociais foram projetadas para conectar pessoas. Mas, na prática, tornaram-se máquinas de confirmação: filtram o que você vê, reforçam o que já pensa e silenciam o que te desagrada. Os algoritmos são treinados para maximizar seu tempo de engajamento — não para promover diversidade de ideias, pensamento crítico, aversão, reflexões complexas ou pluralidade de visões.

E sim, isso não é por acaso. É arquitetura.

Um estudo publicado na revista Teknokultura analisou o comportamento de 1361 adolescentes brasileiros e revelou que cerca de 90% utilizam sites de redes sociais como principal fonte de informação, enquanto apenas 3,8% recorrem a meios de comunicação formais.

Além disso, o fenômeno das “câmaras de eco” – espaço que têm o potencial de ampliar as mensagens entregues ali e isolá-las das mensagens que as contradizem – é amplificado por algoritmos que priorizam conteúdo semelhante ao que você já consome, limitando sua exposição a perspectivas divergentes.

Em tempos de hiperconectividade, a manipulação em massa ganhou novas formas — silenciosas, algoritmizadas e invisíveis (Imagem: Branko Devic/Shutterstock)

Nas conhecidas bolhas digitais (assim como existem as bolhas sociais), as ideias não são apenas repetidas — são amplificadas, distorcidas e servidas em eterno loop. A partir do que lhe é apresentado nas redes, você começa a acreditar que todos pensam como você e, quando encontra alguém que discorda, parece estar lidando com um inimigo, alguém que absurdamente não entende nada do seu mundo perfeito, honesto e lógico.

Sendo assim, nesse mundo de bolhas de desinformação, a pluralidade torna-se exceção, o debate desaparece e polarização vira regra.

Leia mais:

Para não me tornar radical, vamos ser um pouco mais críticos e dividir as responsabilidades: o problema não está apenas no algoritmo, mas na ignorância da confiança cega que depositamos nele. Está na ausência de responsabilidade de produtores de conteúdo, na inexistência popular de pensamento crítico, na falta de transparência nas plataformas e na ausência de regulação em um ambiente que influencia eleições, movimentos sociais e até a saúde mental de populações inteiras.

Enquanto a boiada segue, continuamos alimentando sistemas que nos mantêm entretidos, viciados e — mais alarmante — ignorantes multiplicadores desinformados.

Manipulação digital de massas.
Nas bolhas digitais, vemos apenas o que reforça nossas crenças — o diferente é filtrado, o contraditório, silenciado (Imagem: kentoh/Shutterstock)

Para quem deseja tentar furar a bolha, há saída, mas exige esforço: buscar fontes diversas, seguir vozes que pensam diferente, verificar antes de compartilhar e cobrar responsabilidade das big techs. O que é público precisa ser transparente. O que influencia milhões deve ser regulado.

Afinal, se a sua timeline só confirma o que você já pensa, você não está se informando. Está sendo alimentado. E o que é alimentado demais, uma hora é engolido.

O post O algoritmo nos deixou burros(as). E você ainda curtiu este post apareceu primeiro em Olhar Digital.

unnamed-1

Pontos de Lagrange: ilhas gravitacionais no oceano cósmico

Imagine uma espaçonave utilizando a gravidade dos astros para navegar pelo vasto oceano cósmico, até encontrar uma ilha invisível e serena, onde as forças que movem nossas aventuras pelo espaço estão em perfeito equilíbrio. Essa é a essência dos chamados Pontos de Lagrange — regiões específicas do espaço onde as forças gravitacionais se anulam com precisão matemática, criando verdadeiros refúgios de estabilidade em meio ao movimento celestial. Mais do que uma curiosidade astronômica, os Pontos de Lagrange representam uma solução elegante para um clássico problema da Física e um grande trunfo para as ambições espaciais da humanidade.

Para entendermos essa história, precisamos voltar ao século XVII, quando Isaac Newton revelou ao mundo sua famosa Lei da Gravitação Universal. Ela dizia que todos os corpos do Universo se atraem mutuamente, com uma força que depende da massa de cada um e da distância entre eles. Essa formulação nos permitiu calcular os passos da dança cósmica entre dois corpos, descrevendo órbitas perfeitamente elípticas e previsíveis. A gravitação de Newton nos levou à compreensão dos movimentos da Terra ao redor do Sol, da Lua em torno da Terra e à previsão precisa dos caminhos dos planetas do Sistema Solar.

Mas, ao mesmo tempo em que revelou os segredos da mecânica celeste, o trabalho brilhante de Newton também expôs um problema intrigante: o que acontece quando três corpos interagem gravitacionalmente ao mesmo tempo? O chamado “problema dos três corpos” tornou-se um verdadeiro quebra-cabeça para os cientistas. Enquanto o movimento entre dois corpos podia ser descrito por fórmulas relativamente simples, a introdução de um terceiro corpo criava um sistema dinâmico altamente complexo e caótico. Até hoje, esse problema não possui uma solução exata em sua forma geral — variações mínimas nas condições iniciais podem alterar drasticamente os caminhos seguidos pelos corpos envolvidos.

[ Trajetórias aproximadas de três corpos idênticos localizados nos vértices de um triângulo escaleno e com velocidades iniciais nulas. Imagem: wikimedia.org ]

E é aí que entra o gênio de Joseph-Louis Lagrange.

Em 1772, esse brilhante matemático franco-italiano publicou um “Ensaio sobre o problema dos três corpos”, no qual demonstrou duas soluções especiais para o problema: a colinear e a equilátera. Lagrange identificou cinco regiões específicas no espaço onde um objeto de massa muito pequena — como um satélite — poderia permanecer em equilíbrio gravitacional com dois corpos muito maiores, como o Sol e a Terra.

Esses pontos foram batizados em sua homenagem como Pontos de Lagrange, ou simplesmente L1 a L5. Mas, fazendo justiça histórica, Lagrange não foi o primeiro a descrever todos os cinco. A solução colinear — que abrange os pontos L1, L2 e L3 — havia sido descoberta anteriormente por seu mentor, o físico e matemático suíço Leonhard Euler, por volta de 1750.Mas para entendermos por que essas regiões funcionam como verdadeiras ilhas de estabilidade, é preciso lembrar que, em um sistema orbital com dois corpos, não é exatamente o corpo menor que gira ao redor do maior. Na verdade, ambos orbitam um centro de massa comum. No caso do sistema Terra-Sol, como a massa da Terra é muito menor, esse centro de massa está muito próximo do Sol — mas não exatamente no seu centro.

Leia mais:

Pontos de Lagrange e a Terceira Lei de Kepler

Outro conceito essencial é a Terceira Lei de Kepler, que diz que o quadrado do período orbital de um planeta é proporcional ao cubo da sua distância ao Sol. Na prática, isso significa que quanto mais afastado do Sol, mais tempo o corpo leva para completar uma volta. Mais tarde, as equações de Newton mostraram que esse período também depende da massa do corpo maior, sendo um período menor para uma massa central maior e vice-versa. 

Com esses dois conceitos em mente — o centro de massa do sistema e a relação entre período e distância orbital — começamos a entender como surgem os Pontos de Lagrange.

Considerando o sistema Terra-Sol, o Ponto L1 está localizado entre os dois, a cerca de 1,5 milhão de quilômetros da Terra. Um terceiro corpo nessa posição, por estar mais próximo do Sol do que a Terra, deveria orbitá-lo em um período menor, segundo a Terceira Lei de Kepler. Mas nesse ponto, a atração gravitacional do nosso planeta anula parte da gravidade solar, aumentando o período orbital para coincidir exatamente com o da Terra: um ano. Isso permite que o Observatório Solar SOHO, por exemplo, permaneça ali como se estivesse parado, equilibrando-se entre a Terra e o Sol.

[ Pontos de Lagrange no Sistema Terra Sol – Imagem: wikimedia.org ]

Já o Ponto L2 está também a 1,5 milhão de quilômetros da Terra — só que na direção oposta, além da órbita terrestre. Por estar mais distante do Sol, o período orbital ali deveria ser maior. No entanto, nesse ponto, as forças gravitacionais do Sol e da Terra se somam, reduzindo o período, de um objeto neste ponto, para os mesmos 365 dias e 6 horas do nosso planeta. É justamente em L2 que o Telescópio Espacial James Webb se protege do calor e da luminosidade do Sol, da Terra e da Lua — garantindo o ambiente ideal para registrar as imagens mais espetaculares do Universo.

Da mesma forma que em L2, a soma das gravidades da Terra e do Sol também é responsável pelo Ponto L3, que fica um pouco além da órbita da Terra, mas na direção oposta ao Sol. Embora L3 não seja utilizado atualmente, ele já inspirou propostas de missões e até histórias de ficção científica.

Já os Pontos L4 e L5 — que compõem a solução original proposta por Lagrange — formam triângulos equiláteros com a Terra e o Sol. L4 fica 60° à frente da Terra em sua órbita, e L5, 60° atrás. Ambos estão ligeiramente além da órbita da Terra, mas orbitam o centro de massa do sistema Terra-Sol, na distância certa para que seus períodos orbitais sejam sincronizados com o da Terra.

Os três pontos colineares — L1, L2 e L3 — possuem um equilíbrio instável. Isso significa que objetos posicionados ali tendem a se afastar com o tempo, exigindo manobras periódicas de correção, como as que mantêm o SOHO e o James Webb em suas posições.

Por outro lado, L4 e L5 são regiões de equilíbrio estável. Mesmo quando perturbados por pequenas forças externas, os objetos ali tendem a permanecer próximos desses pontos. É por isso que encontramos objetos naturais em L4 e L5, como os famosos asteroides troianos de Júpiter — que serão visitados pela missão Lucy, a partir de 2027.

[ Asteroides troianos de Júpiter em L4 (60° à frente) e L5 (60° atrás) do gigante gasoso – Créditos: Petr Scheirich / Astronomical Institute of the Czech Academy of Sciences ]

Assim, entre o rigor das equações e a beleza do cosmos, os Pontos de Lagrange nos lembram que até mesmo no aparente caos do universo existe harmonia — refúgios secretos onde forças colossais se equilibram com delicadeza. Seus mistérios foram desvendados matematicamente por Euler e Lagrange, bem antes de nossos telescópios enxergarem os asteroides e de nossos foguetes abrirem os caminhos para a conquista do espaço. Os pontos de Lagrange são como ilhas gravitacionais no oceano cósmico, que acolhem os instrumentos que nos ajudam a compreender o espaço, o tempo e nosso próprio lugar na imensa vastidão do Universo. Em cada ilha de equilíbrio, há um convite à curiosidade, um desafio à engenharia e um novo porto seguro — onde podemos ancorar as espaçonaves da nossa jornada astronômica rumo às estrelas.

O post Pontos de Lagrange: ilhas gravitacionais no oceano cósmico apareceu primeiro em Olhar Digital.

olhar-espacial-1024x765

Enxame de estrelas e Nebulosa da Águia nas imagens astronômicas da semana

Toda semana, no Programa Olhar Espacial, exibimos duas imagens astronômicas que se destacaram na semana que passou. E na última semana, apresentamos mais duas imagens publicadas no site APOD Brasil. Confiram:

Enxame de Estrelas

[ Créditos: Carlos César ]

A primeira imagem retrata o belíssimo Ômega Centauri ou NGC 5139, um dos maiores e mais massivos aglomerados globulares da Via Láctea.  Localizado a cerca de 16 mil anos-luz de distância na direção da Constelação do Centauro, este aglomerado contém milhões de estrelas densamente agrupadas.  A imagem mostra um brilhante núcleo central rodeado por enxame de estrelas que se estende por aproximadamente de 170 anos-luz, criando um cenário deslumbrante. A massa e as características incomuns de Ômega Centauri sugerem que ele pode ter uma origem diferente da maioria dos outros aglomerados globulares, possivelmente sendo o remanescente do núcleo de uma antiga galáxia anã canibalizada pela Via Láctea.

Original em: https://www.apodbrazil.com/gallery/298 

Nebulosa da Águia

[ Créditos: Fernando Magalhães ]

Já a segunda imagem é um fantástico registro da Nebulosa da Águia, também chamada de Messier 16, uma região de formação estelar ativa a 7 mil anos-luz de distância, na Constelação da Serpente.  A imagem captura a beleza da nebulosa, com suas nuvens de gás e poeira iluminadas pela luz das estrelas recém-formadas.  É famosa pela icônica estrutura conhecida como “Os Pilares da Criação”, registrada pelo Telescópio Espacial Hubble.  Os Pilares são colunas densas de gás e poeira que estão sendo esculpidas pela radiação e ventos estelares, e onde uma grande quantidade de novas estrelas são gestadas em seu interior.

Original em: https://www.apodbrazil.com/gallery/294 

APOD Brasil

As escolhas das Imagens Astronômicas desta Semana foram feitas a partir do site APOD Brasil (https://www.apodbrazil.com/), um portal mantido por astrônomos e entusiastas da fotografia, dedicado à divulgação das belezas do Cosmos. O APOD Brasil tem o  objetivo de publicar uma fotografia astronômica a cada dia, divulgando o trabalho de brasileiros, e de outras nacionalidades, empenhados em revelar as maravilhas do nosso Universo. Os interessados em contribuir com o portal APOD Brasil, e também com as Imagens Astronômicas da Semana do Olhar Espacial, podem fazer isso através do formulário disponibilizado no site: https://www.apodbrazil.com/form 

O post Enxame de estrelas e Nebulosa da Águia nas imagens astronômicas da semana apareceu primeiro em Olhar Digital.

shutterstock_2567322955

Pare menos, produza mais: a força da IA na indústria

Imagine o impacto de uma linha de produção interrompida no meio de um turno. O prejuízo vai muito além do maquinário parado: compromete prazos, eleva custos operacionais e afeta toda a cadeia de entrega. E isso ainda acontece com frequência. Segundo um estudo da AlphaBOLD, 82% das empresas industriais enfrentaram paradas não planejadas nos últimos três anos, com um custo médio de US$ 260 mil por hora de downtime.

Diante de um contexto tão desafiador, a pergunta já não é se é possível evitar essas falhas, mas como fazer isso de forma eficiente. A resposta está na aplicação da inteligência artificial à manutenção preditiva. A lógica é clara: uma vez que conseguimos prever um erro antes que ele aconteça, temos a chance de agir preventivamente. 

Com o uso de sensores, coleta de dados em tempo real e modelos de machine learning — tecnologia capaz de identificar padrões e aprender com eles —, antever problemas técnicos deixou de ser uma promessa futura para se tornar uma solução concreta, viável e mensurável.

IA e dados: a nova engrenagem da manutenção industrial

Ao integrar sensores inteligentes aos equipamentos industriais e monitorar variáveis como vibração, temperatura e pressão, é possível criar modelos preditivos com apoio da inteligência artificial, capazes de identificar comportamentos atípicos que precedem interrupções — como em sistemas de envase, que frequentemente apresentam anomalias imperceptíveis a olho nu.

Isso permite programar a manutenção no momento mais adequado, reduzindo o tempo de máquina parada e os custos com reparos e perdas operacionais.

Com inteligência artificial e dados, a indústria ganha previsibilidade e reduz o improviso na hora da manutenção (Imagem: DC Studio/Shutterstock)

Leia mais:

Auxiliada pela análise avançada de dados, que atua como um analista silencioso, presente o tempo todo, interpretando sinais e indicando o momento ideal para agir, a previsibilidade acaba sendo outro benefício valioso. Ao eliminar a dependência do acaso, é possível planejar melhor o uso de recursos, antecipar a reposição de peças e manter toda a cadeia produtiva operando coordenadamente.

Tecnologia acessível, vantagem estratégica

É importante destacar que a manutenção preditiva baseada em inteligência artificial não está restrita às grandes corporações. Com soluções cada vez mais acessíveis e escaláveis, empresas de médio porte também têm a oportunidade de adotar esse modelo, sem precisar reformular completamente seu parque industrial. O crucial é desenvolver a capacidade de coletar os dados certos e, principalmente, saber interpretá-los.

IA e manutenção preditiva.
Manutenção preditiva com IA já é acessível e transforma dados certos em decisões ágeis (Imagem: Gorodenkoff/Shutterstock)

Mas mesmo com o avanço da tecnologia e o aumento da oferta de soluções, ainda há uma barreira a ser superada: a mentalidade reativa. Insistir em modelos baseados apenas em manutenções corretivas ou em cronogramas fixos não condiz mais com a complexidade e a velocidade exigidas pela indústria atual. A boa notícia é que a tecnologia para mudar essa realidade já está disponível; ela não vem para substituir o conhecimento humano, mas para ampliá-lo com mais precisão, contexto e agilidade.

Empresas que conseguirem unir a experiência de seus profissionais com o poder analítico da IA estarão bem preparadas para operar com previsibilidade, eficiência e controle — pilares fundamentais para crescer de maneira sustentável em um setor desafiador.

O post Pare menos, produza mais: a força da IA na indústria apareceu primeiro em Olhar Digital.

shutterstock_2284126663

Machine Learning e Deep Learning: o que vem por trás dos algoritmos?

A inteligência artificial (IA) é, sem dúvida, uma das inovações mais transformadoras da nossa era. Para se ter uma ideia da sua dimensão, um relatório da Grand View Research aponta que o mercado global de IA foi avaliado em mais de US$ 292 bilhões em 2024 — e o crescimento está longe de desacelerar. A expectativa é que esse setor registre uma Taxa de Crescimento Anual Composta (CAGR) de quase 36% entre 2025 e 2030.

Mas afinal, como chegamos até aqui? Embora a IA esteja cada vez mais presente no nosso cotidiano, nem sempre é fácil compreender como ela evoluiu até se tornar o que é hoje ou perceber, com clareza, o impacto real que já causa na vida das pessoas e nos negócios.

É nesse ponto que o Machine Learning e o Deep Learning entram em cena. Esses dois conceitos, que são subáreas fundamentais da IA, ajudam a explicar na prática como essa revolução está acontecendo. E por que vale a pena acompanhar de perto o que vem pela frente, especialmente no que se refere à personalização de serviços e à automação de processos.

O que é Machine Learning?

De forma resumida, o Machine Learning (aprendizado de máquina) desenvolve algoritmos capazes de aprender a partir de dados. Em vez de depender exclusivamente de regras pré-programadas, esses sistemas identificam padrões, fazem previsões e tomam decisões com base nas informações que recebem. Esse aprendizado pode ocorrer de duas formas principais:

⦁ Supervisionado: usado em tarefas de classificação, como identificar spam em e-mails ou a qual categoria pertence um determinado tipo de grão. Além de regressão, que pode prever o valor de um apartamento baseado em suas características e localização, por exemplo.

⦁ Não supervisionado: ideal para agrupar dados e descobrir relações escondidas sem a necessidade de rótulos definidos.

Machine learning: algoritmos que aprendem com os dados para tomar decisões (Imagem: NicoElNino/Shutterstock)

Hoje, é praticamente impossível pensar em setores que não estejam sendo impactados por essa tecnologia. No setor financeiro, por exemplo, o Machine Learning é usado para análise de crédito, identificação de fraudes e previsões de mercado.

Já em plataformas como Netflix e Amazon, a tecnologia garante recomendações personalizadas, aumentando o engajamento dos usuários e, consequentemente, as vendas.

O que é Deep Learning?

O Deep Learning (aprendizado profundo) é uma vertente mais avançada do Machine Learning, baseada em redes neurais artificiais profundas, que são estruturas inspiradas no funcionamento do cérebro humano. Essa tecnologia é especialmente eficaz em tarefas mais complexas, como:

⦁ Processamento de linguagem natural, como análise de sentimentos ou tradutores automáticos;
⦁ Reconhecimento de imagem e voz;
⦁ Sistemas de recomendação altamente sofisticados;
⦁ Robótica e jogos.

Seu principal método de aprendizado é o reforço, no qual o sistema ajusta seus comportamentos com base em tentativas, erros e recompensas, como um cão sendo treinado ou um algoritmo otimizando uma jogada em tempo real.

Leia mais:

Alguns exemplos populares são os grandes modelos de linguagem, como o ChatGPT, Gemini, Claude, DeepSeek, entre outros, que fazem parte da categoria de modelos de Deep Learning treinados com bilhões de parâmetros e dados. Na medicina, os avanços são igualmente expressivos, com diagnósticos por imagem mais precisos e algoritmos que ajudam a identificar padrões em grandes volumes de dados clínicos.

Quando usar Machine Learning ou Deep Learning?

Embora estejam interligadas, as duas abordagens têm características e aplicações distintas. Machine Learning é ideal para bases de dados estruturados, como planilhas e tabelas, onde os padrões são mais simples e diretos.

Já Deep Learning se destaca com dados complexos e desestruturados, como imagens, vídeos, áudios e textos, sendo especialmente eficiente quando é necessário um nível mais profundo de análise e interpretação.

AI deep learning.
Deep learning usa redes neurais profundas para aprender com grandes volumes de dados (Imagem: metamorworks/Shutterstock)

No fim das contas, trata-se de escolher a tecnologia certa para cada desafio. Ambas são formas de ensinar a IA a nos ajudar – cada uma com seus pontos fortes. Reconhecer essas diferenças é o primeiro passo para aproveitar ao máximo o potencial da inteligência artificial, seja para inovar nos negócios ou para transformar a nossa rotina pessoal.

O post Machine Learning e Deep Learning: o que vem por trás dos algoritmos? apareceu primeiro em Olhar Digital.

unnamed-32-1024x420

O eclipse de Halley e a previsão que revolucionou a astronomia

Na manhã deste sábado, 29 de março, a Lua encobriu parcialmente o Sol, em um fenômeno visível apenas em algumas localidades do Hemisfério Norte, principalmente no nordeste do Canadá, onde a Lua ocultou mais de 90% do Astro Rei, formando uma espécie de chifre solar. Agora, mais impressionante do que as imagens que um fenômeno como este pode gerar, é a precisão com que os astrônomos conseguem prever um eclipse atualmente. 

[ Eclipse Parcial do Sol deste dia 29 de março registrado de Agatha, EUA – Créditos: Vinod Kumar ]

Como já vimos anteriormente nesta coluna, a humanidade desenvolveu a capacidade de prever eclipses por volta do ano 600 a.C., quando astrônomos babilônicos perceberam que eles ocorrem em ciclos de 18 anos, 11 dias e 8 horas, o chamado Ciclo de Saros. Por mais de 2 mil anos, o Ciclo de Saros foi utilizado para prever esses alinhamentos cósmicos, até que em 1715 um Eclipse Total do Sol mudou para sempre a história da astronomia. Pela primeira vez, um eclipse não apenas foi previsto, mas sua sombra foi mapeada com uma precisão jamais vista. O avanço daquele eclipse sobre o território inglês foi calculado com exatidão por Edmond Halley. É… aquele mesmo do famoso cometa! 

Mas esse grandioso feito de Halley só foi possível graças ao embasamento fornecido 3 décadas antes, por um dos maiores gênios da humanidade: Isaac Newton.

Em 1687, quando publicou sua obra-prima, “Principia Mathematica”, Newton revolucionou a física e a astronomia, descrevendo as leis da gravidade e fornecendo a base matemática que rege a mecânica celeste. Edmond Halley, além de amigo e grande incentivador de Newton, foi um dos primeiros a perceber o potencial dessa nova ciência. Com sua inteligência e perspicácia, Halley utilizou a física de Newton para calcular a órbita do cometa que ganhou seu nome, e também para prever eclipses com uma precisão nunca antes vista.

[ À esquerda, Isaac Newton. À direita, Edmond Halley – Créditos: Godfrey Kneller / Richard Phillips ]

Em seus estudos sobre esses fenômenos, Halley se deparou com os antigos textos babilônicos que descreviam a ocorrência cíclica de eclipses. Foi ele quem introduziu o termo “Ciclo de Saros” para descrever a repetição dos eclipses, adotando o nome a partir daqueles registros históricos. Halley também se debruçou sobre os cálculos da mecânica celeste, levando em conta a posição do Sol, da Terra e da Lua, e aplicando as leis da Gravitação Universal de Newton para prever o Eclipse Total do Sol de 1715. E Halley não apenas previu a data e a hora do eclipse, mas também calculou, com uma impressionante precisão, a trajetória da sombra da Lua sobre a Inglaterra, determinando até mesmo a duração da totalidade — um feito extraordinário para a época e um marco na história da astronomia. 

A previsão de Halley foi publicada em um mapa detalhado, que mostrava o caminho da totalidade do eclipse sobre a Inglaterra, com a hora exata em que a sombra da Lua chegaria a cada local. E no dia 3 de maio de 1715, o eclipse aconteceu exatamente como Halley havia previsto! A sombra da Lua percorreu o Sul da Inglaterra, transformando o dia em noite por pouco mais de 4 minutos, em um espetáculo que encantou e maravilhou a todos que o testemunharam. A precisão da previsão de Halley foi um triunfo da ciência, fortalecendo a confiança nas leis de Newton e consolidando a astronomia como uma ciência exata.

[ À esquerda, Isaac Newton. À direita, Edmond Halley – Créditos: Godfrey Kneller / Richard Phillips ]

As pequenas discrepâncias observadas na trajetória da sombra do eclipse em relação às previsões de Halley foram fundamentais para aprimorar os dados orbitais da Lua. Com base nesses ajustes, ele conseguiu calcular com ainda mais precisão outro eclipse que ocorreria na Inglaterra nove anos depois, em 1724.

O trabalho pioneiro de Halley abriu caminho para previsões de eclipses cada vez mais precisas. Nos séculos seguintes, os astrônomos refinaram os métodos de cálculo, levando em conta fatores como a forma da Terra, a influência gravitacional dos planetas e, mais tarde, até mesmo os efeitos da relatividade de Einstein. Com o desenvolvimento de computadores e modelos matemáticos avançados, as previsões de eclipses hoje são feitas com precisão milimétrica, permitindo aos astrônomos determinar o tempo exato de início, fim e duração de cada fase do eclipse em qualquer lugar do mundo. Satélites como o DSCOVR, da NASA, monitoram os eclipses em tempo real, fornecendo dados valiosos para os cientistas e aprimorando nossa compreensão da dinâmica gravitacional entre a Terra, a Lua e o Sol.

Graças a essa evolução, já sabíamos que o eclipse de 29 de março seria visível no Brasil somente em uma pequena área do norte do Amapá, onde, no ápice do fenômeno, a Lua encobriria apenas 1% do disco solar. Mas também pudemos dizer que este seria um belíssimo eclipse parcial para os observadores do nordeste do Canadá, onde o Sol nasceu mais de 90% eclipsado, proporcionando um espetáculo de tirar o fôlego. Só não foi tão marcante quanto aquele que ficou conhecido como “O Eclipse de Halley” e que revolucionou a ciência ao demonstrar o poder da matemática e da física para desvendar os segredos do Universo. Se hoje podemos planejar, com antecedência, os melhores locais e horários para contemplar a beleza de um eclipse, é porque gigantes como Isaac Newton e Edmond Halley pavimentaram esse caminho há mais de três séculos, transformando o céu em um relógio cósmico cuja precisão continua a nos maravilhar.

O post O eclipse de Halley e a previsão que revolucionou a astronomia apareceu primeiro em Olhar Digital.

unnamed-29-1024x1024

Planeta Vermelho e encontro celestial nas Imagens Astronômicas da Semana

Toda semana, no Programa Olhar Espacial, exibimos duas imagens astronômicas que se destacaram na semana que passou. E na última semana, apresentamos duas belas imagens do planeta vermelho e do desfile planetário do início do ano. Confira:

Planeta Vermelho em Oposição

[ Créditos: Victor Tellez Garza ]

A primeira imagem é uma foto magnífica de Marte tirada três semanas após sua última oposição ocorrida no dia 16 de janeiro. Durante a oposição, os planetas em órbitas externas à da Terra, ficam mais próximos do nosso planeta, o que nos permite visualizá-los melhor e durante quase toda a noite. A imagem mostra o planeta como um disco avermelhado, com algumas feições da superfície destacadas. As manchas escuras indicam dunas que se deslocam com as tempestades de areia. Do lado esquerdo, vê-se a calota de gelo que encobre o pólo norte marciano. A oposição de Marte ocorre a cada 26 meses terrestres e, além de facilitar sua observação, é o melhor momento para enviarmos as missões espaciais para o Planeta Vermelho.

Original em: https://www.apodbrazil.com/gallery/287 

Encontro Celestial

[ Créditos: B.Haeussler / ESO ]

A segunda imagem é um impressionante registro do desfile planetário feito no início de fevereiro a partir do Observatório de Paranal, no Chile. A imagem é uma panorâmica de 360 graus do céu noturno, mostrando a Via Láctea arqueada acima da paisagem desértica do observatório. Além da Lua, vários planetas do Sistema Solar são visíveis e claramente identificados na imagem: Saturno, Vênus, Netuno, Urano, Júpiter e Marte, todos alinhados em uma linha relativamente reta. Do lado esquerdo, o cometa C/2024 G3 (ATLAS) também é visto com sua cauda brilhante embelezando o horizonte oeste. A imagem é um registro único e belíssimo de um raro encontro celestial.

Original em: https://cdn.eso.org/images/screen/potw2510a.jpg 

Sem anotações: https://cdn.eso.org/images/screen/potw2510b.jpg

APOD Brasil

As escolhas das Imagens Astronômicas desta Semana foram feitas a partir do site APOD Brasil (https://www.apodbrazil.com/), um portal mantido por astrônomos e entusiastas da fotografia, dedicado à divulgação das belezas do Cosmos. O APOD Brasil tem o  objetivo de publicar uma fotografia astronômica a cada dia, divulgando o trabalho de brasileiros, e de outras nacionalidades, empenhados em revelar as maravilhas do nosso Universo. Os interessados em contribuir com o portal APOD Brasil, e também com as Imagens Astronômicas da Semana do Olhar Espacial, podem fazer isso através do formulário disponibilizado no site: https://www.apodbrazil.com/form 

O post Planeta Vermelho e encontro celestial nas Imagens Astronômicas da Semana apareceu primeiro em Olhar Digital.