Pesquisadores da Universidade Estadual de Washington (WSU), nos EUA, deram um passo importante para desvendar por que morcegos conseguem conviver com vírus altamente perigosos, como os coronavírus e hantavírus, sem apresentarem sintomas.
A equipe liderada pelo virologista Michael Letko desenvolveu duas novas linhagens celulares derivadas de morcegos, que agora estão disponíveis para a comunidade científica por meio de um repositório público. O trabalho foi publicado na revista PLOS Biology.
Essas linhagens, criadas a partir de células renais do morcego-de-cauda-curta-de-Seba (Carollia perspicillata), permitem estudar com mais precisão como o sistema imunológico dos morcegos lida com infecções virais.
Até então, a maioria dos estudos usava células humanas ou de roedores, o que limitava o entendimento sobre a tolerância única dos morcegos.
Cientistas desenvolvem linhagens celulares de morcegos para estudar imunidade e comportamento de vírus perigosos (Imagem: Wirestock Creators / Shutterstock)
Descobertas do estudo
Os testes mostraram que essas novas células conseguem suportar infecções por uma variedade de vírus, com destaque para os coronavírus e ortohantavírus — incluindo o vírus Sin Nombre, que causou recentemente uma infecção fatal no estado de Washington, onde fica a WSU.
Segundo Letko, os morcegos são hospedeiros naturais de muitos vírus perigosos para humanos e animais, mas poucas ferramentas estavam disponíveis para investigar esse fenômeno em laboratório.
As linhagens celulares existentes são escassas, antigas (algumas da década de 1960) e nem sempre compatíveis com os vírus de interesse atual.
As novas linhagens oferecem respostas imunes mais realistas e são um recurso valioso para pesquisas futuras.
Novos planos para prevenção de surtos podem aparecer
Além de fornecer novas ferramentas, a equipe da WSU também compartilhou abertamente as linhagens com outros laboratórios, promovendo colaboração científica.
O objetivo agora é usar essas células para investigar como os morcegos evitam os danos causados por infecções virais — o que pode abrir caminhos para novas terapias antivirais e estratégias de prevenção de surtos em humanos.
Nova linhagem celular de morcegos pode explicar sua resistência a vírus letais e guiar novas estratégias de combate a epidemias – Imagem: Shutterstock/Griffin Gillespie
O morcego-vampiro (Desmodus rotundus), um dos mamíferos mais intrigantes do planeta, foi o foco de um estudo inovador que analisou seu metabolismo em condições controladas. Para isso, pesquisadores da Universidade de Toronto, no Canadá, conduziram um experimento curioso: colocaram os morcegos para correr em uma esteira.
Embora inusitada, a abordagem permitiu que os cientistas investigassem a resistência física e o consumo de energia desses animais. O estudo revelou detalhes fascinantes sobre o funcionamento metabólico dos morcegos-vampiros, ampliando a compreensão sobre suas capacidades adaptativas.
Essa pesquisa, publicada na revista Biology Letters, trouxe à tona uma descoberta surpreendente. Ao contrário de outros mamíferos, que utilizam principalmente carboidratos e gorduras como fonte de energia para atividades físicas, os morcegos-vampiros são capazes de metabolizar aminoácidos (componentes das proteínas) de forma muito eficiente.
Veja um vídeo de um morcego-vampiro caminhando na esteira (gravado por Kenneth Welch, um dos pesquisadores):
Como funciona o metabolismo do morcego-vampiro
Essa capacidade metabólica única permite que os morcegos-vampiros, que se alimentam exclusivamente de sangue, obtenham a energia necessária para atividades como voar e correr, mesmo com uma dieta rica em proteínas e pobre em carboidratos.
O estudo
Os cientistas alimentaram os morcegos com sangue de vaca contendo glicina e leucina, dois aminoácidos.
Os morcegos-vampiros foram colocados para correr em esteiras a velocidades de 10, 20 e 30 metros por minuto.
Os cientistas monitoraram a respiração dos morcegos, registrando a taxa de oxigênio ingerido e a de dióxido de carbono expelido.
Os resultados
Os morcegos-vampiros conseguiram correr por até 90 minutos.
Os morcegos metabolizaram aminoácidos, que corresponderam a até 60% da energia que usaram para correr.
Os morcegos-vampiros têm uma habilidade única de metabolizar rapidamente os aminoácidos do sangue que consomem.
Morcegos-vampiros são animais sociais e vivem em colônias (Imagem: Amrisa M / Shutterstock)
Os resultados do estudo mostraram que os morcegos-vampiros podem correr por longos períodos e com grande intensidade, utilizando a energia obtida da metabolização dos aminoácidos presentes no sangue que consomem. Essa descoberta desafiou as noções anteriores sobre o metabolismo dos mamíferos e revelou uma adaptação evolutiva incrível desses animais.
O estudo dos morcegos-vampiros ajuda a entender como os animais se adaptam a dietas extremas e como o metabolismo pode evoluir para atender às necessidades específicas de cada espécie.
A compreensão do metabolismo dos morcegos-vampiros pode ter implicações para o desenvolvimento de novas terapias para doenças relacionadas ao metabolismo, como diabetes e obesidade, por exemplo.
De onde vem a energia?
A pesquisa realizada com morcegos-vampiros em esteiras revelou uma incrível capacidade adaptativa desses animais, desafiando as noções convencionais sobre o metabolismo de mamíferos. Mas a pergunta que fica é: de onde eles tiram energia para caminhar e por que gostam tanto dessa atividade?
A principal fonte de energia dos morcegos-vampiros é o sangue que eles consomem. Os morcegos-vampiros se alimentam do sangue de aves e mamíferos, incluindo o gado. Eles também praticam um comportamento chamado trofalaxia, no qual um indivíduo regurgita sangue para alimentar outro membro da colônia que não conseguiu se alimentar.
Em casos raros, morcegos-vampiros podem se alimentar de sangue de humanos, especialmente em regiões onde há contato próximo com animais de criação.
A pesquisa com morcegos-vampiros em esteiras demonstrou a importância de estudos inovadores para expandir nosso conhecimento sobre a natureza (Imagem: Wirestock Creators / Shutterstock)
A pesquisa mostrou que esses animais possuem uma habilidade única de metabolizar rapidamente os aminoácidos presentes no sangue, transformando-os em energia utilizável para atividades físicas. Essa adaptação evolutiva permite que eles tenham um desempenho físico surpreendente, mesmo com uma dieta rica em proteínas e pobre em carboidratos.
A capacidade de caminhar é eficaz para a sobrevivência dos morcegos-vampiros. Essa habilidade os ajuda a:
Buscar alimento: os morcegos-vampiros precisam se locomover no solo para encontrar suas presas, que geralmente são mamíferos que dormem.
Evitar predadores: a capacidade de correr rápido ajuda os morcegos-vampiros a escapar de predadores.
Explorar o ambiente: caminhar permite que os morcegos-vampiros explorem diferentes áreas em busca de novas fontes de alimento e locais seguros para descansar.
Por que os morcegos-vampiros foram colocados em esteiras?
As esteiras permitem medir a velocidade, a resistência e a quantidade de energia gasta pelos morcegos durante a locomoção. Ao controlar a velocidade e a inclinação da esteira, os pesquisadores podem estudar como o metabolismo dos morcegos se adapta a diferentes níveis de atividade física.
Ao variar a composição da dieta dos morcegos, os pesquisadores podem analisar como diferentes nutrientes afetam o desempenho físico dos animais.
As esteiras utilizadas para esses estudos são especialmente adaptadas para animais pequenos e delicados, e os morcegos são monitorados de perto durante todo o experimento, como é possível observar neste outro vídeo:
É importante ressaltar que os estudos com morcegos-vampiros em esteiras são realizados com o máximo cuidado para garantir o bem-estar dos animais. Os pesquisadores seguem rigorosos protocolos éticos e trabalham em estreita colaboração com veterinários para garantir que os animais não sofram nenhum tipo de estresse ou dor.
Os estudos com morcegos-vampiros em esteiras contribuíram para uma melhor compreensão do metabolismo e da fisiologia desses mamíferos. Essa pesquisa não apenas expande nosso conhecimento sobre a biodiversidade, mas também pode ter implicações importantes para a pesquisa médica e biotecnológica.
Todos os morcegos sugam sangue?
Não, nem todos os morcegos se alimentam de sangue. Essa é uma ideia bastante comum, reforçada por filmes e histórias de terror, mas é um grande mito. A grande maioria dos morcegos é frugívora, ou seja, se alimenta de frutas. Existem também espécies que comem insetos, néctar e até mesmo peixes. Os morcegos hematófagos, que se alimentam de sangue, são uma minoria. Existem apenas três espécies de morcegos-vampiros, todas encontradas nas Américas. Abaixo, foto de um morcego-fruteiro, da família Pteropodidae, composta por morcegos que se alimentam de frutas e néctar.