Brasil tem papel vital em projeto que quer revelar mistérios da origem do Universo

Um dos mais ambiciosos projetos científicos da atualidade está contando com contribuição essencial de pesquisadores brasileiros para desvendar alguns dos maiores mistérios do cosmos.

O Experimento Subterrâneo Profundo de Neutrino (DUNE, na sigla em inglês) pretende responder questões fundamentais sobre a origem do Universo a partir do estudo de neutrinos, partículas subatômicas surgidas logo após o Big Bang.

Com investimento total de US$ 3,7 bilhões (R$ 20,91 bilhões, na conversão direta), o projeto conecta dois estados dos EUA via estrutura grandiosa que inclui cavernas subterrâneas a 1,6 quilômetro de profundidade, cada uma com 150 metros de altura e comprimento.

Estas instalações abrigarão quatro detectores do tamanho de prédios de sete andares, preenchidos com 17 mil toneladas de argônio líquido ultrapuro cada um.

DUNE pretende responder questões fundamentais sobre a origem do Universo a partir do estudo de neutrinos (Imagem: Divulgação/Fermilab)

“É um protagonismo que eu desconheço que o Brasil tenha tido no passado. Realmente, é muito importante porque é um experimento, um dos mais importantes da ciência no mundo na atualidade, que vai durar por muito tempo, né? Durante 20, 30 anos, a Unicamp e o Brasil estarão na vitrine da ciência e da tecnologia mundial“, afirma o professor Pascoal Pagliuso, coordenador da pesquisa pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), em entrevista ao g1.

O que são neutrinos?

Neutrinos são partículas subatômicas que surgiram segundos após o Big Bang e são a segunda partícula elementar mais abundante no Universo, atrás apenas dos fótons. Estão por toda parte e atravessam nossos corpos a todo momento, como se fôssemos invisíveis para eles.

Apesar de sua abundância, são extremamente difíceis de detectar, pois raramente interagem com a matéria. É justamente essa característica elusiva que torna seu estudo tão desafiador e potencialmente revelador para os mistérios da física.

Tecnologia brasileira imprescindível para tentar resolver os mistérios do Universo

A participação brasileira no DUNE é considerada fundamental por duas tecnologias desenvolvidas na Unicamp: um processo revolucionário de purificação de argônio líquido e o detector de luz X-Arapuca.

O argônio, gás nobre que se liquefaz a −184 °C, serve como meio para captar as interações dos neutrinos.

“Esse argônio líquido tem que ser ultra puro. É, mais ou menos como você não poder ter uma gotinha de oxigênio numa piscina olímpica. Se você tiver uma gotinha de oxigênio líquido numa piscina cheia de argônio, vai estragar o experimento. E nós [Unicamp] desenvolvemos o método de purificação para fazer o argônio que será usado”, explica Pagliuso.

Já o X-Arapuca é um dispositivo que captura a luz ultravioleta produzida quando um neutrino colide com um átomo de argônio, transformando-a em luz visível para análise. O experimento contará com 1,5 mil módulos deste dispositivo.

“Argônio é o meio, é o alvo do neutrino, é o meio pelo qual o neutrino vai passar e vai permitir a criação de partículas devido à passagem dele. Existe uma probabilidade de, quando ele passar, ele criar outras partículas pela interação com o núcleo do argônio”, detalha o professor.

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Em busca das respostas fundamentais com o DUNE

Os cientistas envolvidos no DUNE esperam responder pelo menos três grandes questões sobre o Universo:

  1. Por que a matéria predominou sobre a antimatéria? Após o Big Bang, o Universo deveria ter criado quantidades iguais de matéria e antimatéria. No entanto, algo quebrou esse equilíbrio, permitindo que a matéria prevalecesse e formasse planetas e, eventualmente, vida. Os neutrinos podem ser a chave para entender essa assimetria;
  2. Como se formam os buracos negros? Quando uma estrela explode e colapsa, uma das primeiras emissões é um feixe de neutrinos. “Os neutrinos emitidos nessa explosão trazem informação do processo de formação do buraco negro. Dessa forma, estudando os neutrinos, nós podemos responder como ocorre a formação dos buracos negros e como que ele se desenvolve”, explica Pagliuso;
  3. Os prótons podem decair? Teorias avançadas sugerem que os prótons, considerados estáveis pela física convencional, poderiam se desintegrar e se transformar em partículas menores como neutrinos. Se esse fenômeno, nunca observado antes, for detectado no DUNE, poderia ajudar a comprovar a Teoria de Campo Unificado proposta por Einstein.

Como funcionará o experimento

O ambicioso experimento operará da seguinte maneira:

  1. Neutrinos serão gerados por um acelerador de partículas localizado em Chicago, Illinois (EUA);
  2. Essas partículas viajarão 1,3 mil quilômetros por baixo da superfície até Dakota do Sul (EUA);
  3. No trajeto, passarão pelos gigantescos detectores preenchidos com argônio líquido ultrapuro;
  4. Ao interagir com o núcleo do argônio, emitirão partículas carregadas de luz;
  5. A luz será captada pelos módulos X-Arapuca.

“É possível que, a partir do ano de 2028 ou 2029, os detectores estarão prontos e já completos com o argônio líquido puro. Então, a princípio, o DUNE pode funcionar no final de 2028 ou começo de 2029, estudando os neutrinos atmosféricos, ou seja, gerados pelo Sol ou por fontes do Espaço“, prevê Pagliuso.

Colaboração internacional e investimentos

O DUNE é um empreendimento global que reúne 1,4 mil cientistas de mais de 200 instituições em 37 países, com a maior parte do financiamento vindo do Departamento de Energia dos Estados Unidos.

O Brasil contribui com aproximadamente R$ 200 milhões, dos quais a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) e a Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP), vinculada ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI), aportaram cerca de R$ 90 milhões cada.

Além da Unicamp, que coordena as equipes brasileiras de pesquisa, o projeto conta com a participação do Grupo Akaer, de São José dos Campos (SP), e outras empresas coexecutoras na produção das tecnologias desenvolvidas.

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Túnel gigante ligará as instalações (Imagem: Ryan Postel/Fermilab)

Impacto além da física fundamental

Pagliuso ressalta que os benefícios do DUNE vão além da busca por conhecimento fundamental. A tecnologia de purificação desenvolvida para o argônio já rendeu uma patente e poderá ser aplicada em outros contextos.

“Estamos usando para o argônio líquido, é verdade, mas isso pode se aplicar em qualquer outro gás ou líquido, até para purificar oxigênio hospitalar ou reservar hidrogênio para combustíveis. A gente desenvolveu uma tecnologia que pode se converter em vários outros aspectos, de outras formas diferentes”, destaca o pesquisador.

As escavações das cavernas subterrâneas foram concluídas em agosto de 2024 e, atualmente, o projeto está na fase de construção dos equipamentos. A expectativa é que o primeiro feixe de neutrinos seja lançado em 2030, quando o experimento começará oficialmente suas operações.

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Partículas misteriosas: neutrinos estão mais perto de serem desvendados

Não sabemos muito sobre os neutrinos, essas partículas sem carga e de interação fraca são abundantes no Universo, mas bem difíceis de detectar. Mas uma pesquisa divulgada nesta quinta-feira (10), mediu um neutrino com o maior grau de precisão já feito até hoje e nos colocou mais perto de entender essa partícula.

Ainda não sabemos o peso exato dos neutrinos, mas agora descobrimos que eles têm um peso diferente de zero. Isso muda muita coisa na física, pois indica que o Modelo Padrão, que basicamente serve de guia para a física de partículas, está errado nesse quesito. 

Segundo o modelo, os neutrinos não deveriam ter peso algum. “Estamos tentando entender por que estamos aqui”, disse John Wilkerson, físico da Universidade da Carolina do Norte, em Chapel Hill, e um dos autores do novo estudo, ao The New York Times.

Por que é importante desvendar os neutrinos?

Uma das características mais impressionantes dos neutrinos é a sua capacidade de atravessar a matéria praticamente sem interagir com ela. Bilhões deles passam por nosso corpo a cada segundo, vindos principalmente do Sol, onde são produzidos em reações nucleares, mas também de outras fontes cósmicas, como supernovas e até mesmo do decaimento radioativo de elementos na Terra. 

Essa interação extremamente fraca faz com que detectá-los seja um enorme desafio, exigindo experimentos gigantescos e ultra-sensíveis, como os realizados em laboratórios subterrâneos para evitar interferências de outras partículas.

Existem três tipos de neutrinos, cada um associado a uma partícula diferente: o neutrino do elétron, o neutrino do múon e o neutrino do tau. 

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O mais intrigante é que eles podem “oscilar”, ou seja, se transformar de um tipo em outro enquanto viajam pelo espaço. Esse fenômeno só é possível porque os neutrinos têm massa, e foi justamente essa descoberta que rendeu o Prêmio Nobel de Física em 2015.

Além de serem peças-chave para entender os processos que ocorrem no interior das estrelas, os neutrinos podem ajudar a desvendar alguns dos maiores mistérios do Universo.

Como a pesquisa foi feita?

A pesquisa foi feita usando o experimento Karlsruhe Tritium Neutrino, ou KATRIN. O aparelho foi usado para reduzir a massa da partícula o máximo possível. O dispositivo possui 70 metros, que basicamente utilizou uma fonte de trítio para decair do hidrogênio com dois nêutrons em seu núcleo. Como o trítio é instável, ele decai em hélio e libera um antineutrino, uma espécie de antimatéria do neutrino, que deve ter seu mesmo peso. 

Reprodução de neutrinos (Imagem: Shutterstock)

Ao combinar dados das cinco primeiras execuções do experimento, os pesquisadores reduziram o limite superior da massa do neutrino por um fator de dois em comparação com o resultado anterior. A conclusão é que esse valor não era maior que 0,45 elétron-volts, nas unidades de massa usadas pelos físicos de partículas, um milhão de vezes mais leve que um elétron.

A expectativa é que com 1000 dias de experimentos os pesquisadores tenham dados ainda mais precisos. “Este é, por enquanto, o melhor limite do mundo”, disse o pesquisador.

“Há algo realmente interessante acontecendo”, finalizou Wilkerson.”E a solução provável para isso será a física além do Modelo Padrão.” A pesquisa foi publicada na Science.

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Neutrino descoberto no Mar Mediterrâneo pode revelar segredo do Universo

O neutrino mais energético já registrado foi detectado no Mar Mediterrâneo. Chamado de KM3-230213A, ele tem nível de energia mil vezes maior que fragmentos gerados pelo maior acelerador de partículas do mundo, o Grande Colisor de Hádrons (LHC, na sigla em inglês).

Segundo o estudo, o fenômeno carregava energia de 220 peta-elétron-volts (PeV), maior que qualquer episódio já catalogado. O evento foi registrado em fevereiro de 2023 e divulgado em fevereiro em artigo publicado na revista Nature.

A origem do neutrino ainda é desconhecida, mas pesquisadores já especulam hipóteses. Possivelmente, a partícula foi disparada por algum evento astronômico extremo, como blazares ou interações de raios cósmicos com o fundo cósmico de micro-ondas.

Descoberta pode ajudar a desvendar os mistérios dos blazares (Imagem: M. Kornmesser/ESO)

O que são estes fenômenos extremos?

  • Um Blazar é um tipo de galáxia ativa que hospeda um buraco negro supermassivo em seu centro;
  • O que torna os Blazares tão especiais é a maneira como eles emitem radiação eletromagnética, incluindo luz visível, raios-X e raios gama;
  • Já as interações de raios cósmicos com o fundo cósmico de micro-ondas (CMB, na sigla em inglês) ocorrem quando partículas extremamente energéticas, como prótons, colidem com fótons remanescentes do Big Bang;
  • Essas colisões podem gerar novas partículas, como píons, que decaem e produzem neutrinos de alta energia;
  • Esse processo ocorre em escalas cosmológicas e é um dos mecanismos que podem explicar a origem de neutrinos ultra-energéticos detectados na Terra.

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Como o telescópio detectou o neutrino

O Cubic Kilometre Neutrino Telescope (KM3NeT) é um telescópio submarino instalado no fundo do Mar Mediterrâneo, projetado para detectar neutrinos de alta e baixa energia. Seus sensores estão distribuídos a até 3,5 mil metros de profundidade, onde a escuridão e a densidade da água ajudam a minimizar interferências.

Módulo óptico digital do sistema de detecção do KM3NeT, fotografado por submarino a 3050 m de profundidade
Telescópio KM3NeT a 3.050 m de profundidade (imagem: Reprodução/KM3NeT)

A detecção do neutrino KM3-230213A foi realizada pelo ARCA, um dos dois sistemas do KM3NeT, especializado em partículas de altíssima energia. O telescópio identifica neutrinos ao observar os clarões de luz azul produzidos quando essas partículas atravessam a água do mar e interagem com outras partículas, gerando radiação Cherenkov.

Esse brilho é captado por módulos ópticos digitais (DOMs, na sigla em inglês), equipados com fotomultiplicadores que registram o evento e permitem reconstruir a trajetória e a energia do neutrino.

Os pesquisadores ainda não chegaram a uma conclusão se o neutrino veio de um blazar ou das interações de raios cósmicos com o fundo cósmico de micro-ondas (CMB, na sigla em inglês). Saber de onde veio a partícula pode ajudar a entender melhor esses fenômenos.

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